- Seus vagabundos, acordem logo, não pago vocês para dormir!
Jack abriu os olhos devagar e os esfregou, se sentou na rede, deu um longo bocejo e olhou ao redor, todos estavam levantando ou se espreguiçando, ele havia conseguido sair do reino junto de um navio de contrabandistas, haviam oferecido um emprego de Observador, o ultimo tinha morrido ao ser atingido por uma Bola de Canhão de uma Fragata que havia sido tomada por alguns Piratas, e estavam fechando a passagem entre o Reino Haydn e o Reino Crevecouer, dois grandes aliados comerciais, ele se levantou e foi ao Convés, o Capitão Albert distribuía um pão para cada um dos tripulantes, quando Jack pegou o seu, estava muito frio, ele o guardou e subiu ao Posto de Observação, pegou o pão e, estalou os dedos, formando uma pequena chama que crepitava em sua mão, ele a passou no pão e o esquentou até novamente ficar crocante, comeu como se fizesse anos que ele não comesse, Jack pegou a Luneta que estava no chão de madeira e começou a fazer seu trabalho:
- Cavelier!
Jack olhou para baixo, o Capitão estava o chamando, quase tinha se esquecido que havia dado um Sobrenome falso na hora de se alistar, ali ele se chamava Jack Cavelier:
- Ja estou indo Senhor!
Ele desceu rapidamente, e quando chegou ao convés, o Capitão deu um murro na boca dele, ainda atordoado, o Capitão o segurou e o jogou no chão, Jack limpou o sangue que escorria da boca e olhou curioso para o agressor:
- Nós não nos damos bem com ladrões garoto, principalmente quem rouba um Rei!
Ele levantou o casaco de Jack com a mão esquerda, e com a mão direita apontou para o bordado prateado com a Letra H, Jack ficou assustado, pensou que ele havia descoberto sobre seu passado:
- Roubou isso dos Haydn?
Jack engoliu em seco, não sabia como iria explicar sobre isso, mas era melhor que notassem que ele era filho de Willian Haydn, embora a manhã estivesse fria, começou a suar, percebeu que os olhares de todos aqueles homens mal encarados estavam virados a ele:
- Eu não... Não roubei de ninguém Senhor!
O Capitão soltou uma risada, jogou o casaco em Jack e lhe deu um chute na perna esquerda, Jack segurou a perna, segurando a dor:
- Eu não quero um Ladrão Mentiroso em meu navio, ira ajudar na cozinha, onde o Caolho poderá ficar te observando, e quando chegarmos ao Porto do Reino de Crevecouer amanhã cedo, quero que suma do meu navio, colocarei outro para ser o Observador!
Jack soltou a perna e apertou o casaco, seus olhos vermelhos olhavam com indignação para o Capitão, enquanto o tal se afastava, pensava na burrice que tinha feito, deixando suas coisas jogadas, sua perna doía, mas com um pouco de esforço, pegou o casaco, se levantou e se dirigiu a escada que levava a Cozinha, hesitou ao abrir a porta, o cheiro de alho que vinha da cozinha fez com que ele ficasse enjoado, mas logo que entrou, viu que era bem pequena, havia uma bancada de madeira cheia de legumes, na qual um homem bem alto e negro, os cortava impiedosamente:
- Você é o Caolho?
O Homem parou de cortar os legumes e virou o rosto para Jack, um dos olhos dele era visivelmente cego, com uma cicatriz que o cruzava, os dois ficaram se encarando por um tempo, mas logo Caolho deu um sorriso:
- Qual o seu nome e o que você fez para que Albert lhe mandasse ser meu ajudante?
Jack levantou o casaco, e apontou a letra H:
- Meu nome é Jack... Cavelier, e o Capitão me acusou de ser um ladrão, e me mandou que viesse para cá, para que você ficasse de olho em mim!
O Caolho soltou uma gargalhada, fincou a faca em uma batata que estava na bancada e pegou o casaco da mão de Jack:
- E você roubou isso?
- Não, eu não roubei!
Ele devolveu o casaco, Jack o colocou no mesmo instante:
- Eu acredito em você, não acho que seria tolo o suficiente para tentar roubar Willian Haydn, é um homem perigoso...
O Sorriso se esvaiu de seu rosto, ele pousou a mão no olho cego, Jack percebeu que não era apenas ele que teria rancor de seu pai, ele poderia encontrar outros que estivessem decididos a lutar contra a Tirania dele, mas antes, ele teria de escutar a historia de Caolho, então, meio hesitante, Jack perguntou:
- Me desculpe por perguntar... Mas como o seu olho ficou assim?
O Caolho deu um suspiro, olhou nos olhos de Jack por um tempo e logo após, baixou a cabeça:
- Desde que nasci eu era um Escravo da Família Haydn, vi minha mãe ser morta na minha frente, e minha irmã de Sangue ser estuprada e ter tido o mesmo destino de minha mãe, quando eu fiz dezessete anos, um dos guardas teve um infarto dentro da casa de escravos, nós roubamos as chaves dele e fugimos, foi a mesma noite em que a Rainha morreu, enquanto via meus irmãos serem mortos pelos guardas enfurecidos, eu subi no telhado do castelo para tentar me esconder, eu escutei gritos vindos de uma janela, eu resolvi me aproximar para ver o que estava ocorrendo, quando vi a barriga da Rainha, sendo queimada e aberta por Chamas azuis, o quarto filho da Rainha estava vivo, a Parteira foi morta pelo rei logo após isso, então, o Rei me viu pela janela, eu tentei descer do telhado, mas os Guardas me capturaram rapidamente por ordens diretas, eles me levaram a ele, o Tirano teve piedade de mim, disse que me deixaria viver, pois ninguém acreditaria em um escravo, mas que deixaria uma marca como advertência... Três anos depois eu fugi do Reino!
O Silêncio tomou conta do lugar, Jack não sabia o que dizer, então, o Caolho continuou:
- Agora, quero que me responda duas coisas!
Jack assentiu, aflito:
- Pode me perguntar!
- Eu quero que você me responda com honestidade! Porque um garoto tão novo esta em um navio de contrabandistas e porque você possui um casaco com a marca dos Haydn!
Jack engoliu em seco, o Caolho olhava fixamente para ele com seu olho bom, esperando uma resposta, Jack não sabia o que dizer, mas se quisesse que Caolho se aliasse a ele, tinha de contar a verdade sobre ele, sobre seu passado, sobre seu dom, ele apertou os dedos bem forte, já sentia o calor intenso da chama sob eles:
- Quer a verdade não é? A resposta para suas perguntas é uma só, aqui esta...
Jack abriu a mão, uma pequena chama apareceu em sua palma, o Caolho olhava perplexo:
- Você é um Demônio do fogo!
Jack estalou os dedos e as chamas se apagaram de sua mão, encostou as costas na parede de madeira da cozinha, deu um suspiro e disse:
- Meu nome não é Jack Cavelier... É Jack Haydn! Pelo meu dom, meu pai sempre me odiou, então a dois dias, quando eu fiz Vinte e um anos, eu fugi do Castelo!
As lembranças passaram sobre Caolho como se viessem com o ar:
- Você é o garoto que eu vi nascer na noite da Morte da Rainha... Você é o quarto filho de Willian Haydn!
O Caolho retirou o Facão que estava fincado na bancada de madeira e o apontou para Jack:
- Agora me diga o que faz aqui no Barco!
Jack tentava ser o mais cauteloso possível, agora era o momento de trazer aquele homem ao seu lado:
- Decidi que iria viajar para todos os três Reinos Subordinados de meu Pai, antes de finalmente purifica-lo com o fogo, matarei os seus subordinados!
O Caolho foi colocando o facão bem devagar na bancada, sentou-se em uma das caixas de madeira que estavam chão, colocou a mão no rosto, e para a surpresa de Jack, começou a rir :
- Deixe eu ver se entendi... - Ele deu uma gargalhada - Você quer matar Dante Crevecoeur, Alexander Mortain e Callum Mordaz, os Três Reis Subordinados, e depois vai matar o seu pai... O Rei Tirano! Willian Haydn?
- Não vejo a graça!
- E deixe que eu adivinhe, você escutou a historia sobre o meu olho e pensou que se me contasse a verdade eu me juntaria a você nessa busca obsessiva por vingança? Pensou que eu me arriscaria por uma chance minima de vingar minha mãe, minha irmã e a mim?
Jack baixou a cabeça, não estava acontecendo como ele havia planejado, mas de repente, o Caolho estendeu a mão para ele, Jack levantou a cabeça e viu que ele estava sorrindo:
- Eu só encontraria outra chance dessas em outra vida, então, acho que vou aceitar a proposta e irei te ajudar nessa tolice!
Jack sorriu e apertou a mão dele, Caolho se espreguiçou e perguntou:
- Então, qual é o primeiro passo?
- Arranjar uma embarcação e uma tripulação que me siga!
- Então é só tomar este aqui, o nome desta embarcação é Ignis, e embora seja de contrabando, ja destruiu uma Fragata de Guerra apenas com seus canhões, os tripulantes são todos assassinos, ladrões e refugiados, é quase certo que todos tenham suas desavenças com Willian Haydn!
Jack se sentiu ofendido, o Capitão havia o acusado de roubo e vários tripulantes eram ladrões:
- Mas porque então o Capitão ficou com tanto medo de eu ser um ladrão?
- Porque Albert Bauquemare é um contrabandista que por debaixo dos panos é uma Marionete de Reis, muito dinheiro e recursos vem do contrabando, ele teme que achem que ele esta abrigando alguem que roubou de um Rei!
- Entendo... E como faremos para tomar o Ignis?
O Caolho se curvou para frente, se ajustando na Caixa de madeira onde estava sentado, deu um soco no ar e disse:
- Você terá que usar seu... Dom! Terá que impor respeito perante os outros tripulantes, terá que queimar Albert na frente de todos no Convés e se tornar o novo Capitão!
- O que? Eu não posso mata-lo!
- Você decide, se tomarmos por organizar um Motim, ninguém te seguirá, precisa mostrar que esta acima deles, que eles não podem te oferecer nenhum perigo! A sua unica opção é matar Albert Bauquemare pelo fogo!
Jack estava aflito, ele havia prometido que iria ter sua vingança, sabia que sacrifícios teriam de ser feitos, mas não estava tão preparado quanto pensava:
- O que vou fazer...
- Você eu não sei, mas eu tenho que voltar ao trabalho, já conversamos demais e tenho que preparar o almoço, e você tem que me ajudar, pegue o saco de pão e traga aqui!
Jack obedeceu, estava atordoado, entregou o saco de pão, o Caolho falava o que ele tinha de fazer e ele obedecia, mas não prestava muita atenção, a unica coisa que tinha na cabeça era a promessa que havia feito a seu Pai....
" - Eu voltarei, mas quando o fizer, será para terminar com sua tirania, a qualquer custo! "
" - A qualquer custo! "
Fim do Capitulo.1
Autor: Yago Barbosa Coutinho.